Aconteceu em uma sexta-feira treze

Sexta-feira treze. Meia-noite.
Eu e mais dois amigos brincávamos com uma tábua ouija. Sem o menor preparo ou respeito, tentávamos nos comunicar com algum espírito. Após vinte e dois minutos de tentativas frustradas, a peça começou a se mover de maneira estranha e independente. Um vento gelado entrou pela janela, enquanto a seqüência de letras formavam um nome: Captain Howdy. Então, gritamos e...
Não. Não foi bem assim.
Foi assim: Sexta-feira treze. Meia-noite.
Eu a conheci no baile da minha pequena cidade. A garota mais linda de todas. Seus longos cabelos negros desciam pesadamente emoldurando a mínima cintura no esvoaçante vestido branco. Estava apaixonado. Dançamos todas as valsas, até que tentei beijá-la e ela se esquivou. "Preciso ir embora, você me leva?". Seguimos no meu carro pela estrada velha, por vinte e dois quilômetros, até pararmos em frente ao velho cemitério. A luz iluminou a brancura de sua pele no momento terrível em que ela sentenciou:
- Estacione perto daquele túmulo. É ali que eu moro.
O pavor tomou conta de mim e...
Não. Está errado. Não foi assim, também.
Eu me lembro que havia uma mulher, na estrada, pedindo ajuda.
Isso mesmo! Foi assim: Sexta-feira treze. Meia-noite.
Meu caminhão rasgava a estrada. Com toda atenção no volante, eu não pensava em nada, apenas admirava o breu e o frio da tenebrosa madrugada. Ainda havia um longo caminho a percorrer e o rádio era meu único companheiro. Foi quando, próximo ao quilômetro vinte e dois, uma mulher toda ensanguentada surgiu pelo acostamento gritando:
- Por favor, ajude minha filha! Ela ficou presa nas ferragens!
Um acidente havia ocorrido. Mais ao fundo, vi o carro capotado. Rapidamente, estacionei na beira da estrada e, com minha caixa de ferramentas em mãos, entrei no mato atrás mulher que, para meu espanto, sumiu na escuridão das árvores. Aproximei-me do carro guiado pelo choro de uma criança e lá estava a pequena garotinha, levemente escoriada, com o rosto lavado em lágrimas, ainda presa ao cinto de segurança. À frente, no banco do motorista, a mãe da garota estava com o corpo completamente esmagado, mas reconheci em seu rosto a mulher que me pedira ajuda segundos atrás. Mesmo morta, sua expressão era de gratidão.
Nada disso. Está confuso. Na verdade, havia uma bruxa, ou melhor, vinte e duas.
Sexta-feira treze. Meia-noite.
Após mais um de meus ataques de sonambulismo, despertei em uma clareira na floresta proibida. Apenas a grande lua cheia e uma fogueira à frente quebravam a densidade da noite. Contrariando o bom senso que me dizia para voltar à mansão, decidi me aproximar e, sorrateiramente, descobrir o que estava ocorrendo.
Vinte e duas belas mulheres dançavam nuas em volta do fogo. Pude reconhecer algumas criadas da mansão e garotas do vilarejo entre elas. Havia alguns símbolos estranhos pintados em seus corpos com uma espessa tinta vermelha. Entoavam cânticos em algum idioma profano.
Do meio das árvores, um enorme bode negro surgiu e juntou-se a elas em torno da fogueira que, em alguns momentos, cuspia labaredas azuladas e sobrenaturais. Uma das garotas cobriu o animal com um manto escarlate e, para o meu espanto, o bode ergueu-se como um homem. Em êxtase febril, as bruxas contorceram seus corpos e reviraram seus olhos quando seu mestre proferiu:
- Tragam-me o sacrifício desta noite.
Então, todas, ao mesmo tempo, cessaram seus movimentos e olharam em minha direção. Não tivem nem tempo de correr.
Acho que não foi assim. Foi mais simples. Sexta-feira treze. Meia-noite.
Eu e meu pai corríamos pela floresta. Em seu colo, papai levava minha irmã recém-nascida completamente enrolada em um perfumado xale branco. Paramos e ele disse:
- Filho, não adianta. A fera vai nos alcançar. Vamos! Suba nessa árvore.
Cumprindo as ordens paternas, escalei até o galho mais alto e, assim que me acomodei, papai entregou-me minha irmã:
- Fique com ela. Vou continuar correndo para despistar o monstro. Não saia daí até o amanhecer, está bem?
Concordei e papai deu aquele seu velho sorriso brilhante, cheio de esperança, que me trazia paz. Então, ouvimos estalos e meu pai correu para o meio do mato, fazendo o máximo de barulho possível. Vinte e dois minutos se passaram sem que nada acontecesse, até que ouvi um terrível uivo. Era a fera.
Minha irmã começou a chorar e eu tentei embalá-la, apesar de estarmos equilibrados em um galho. Em questão de segundos, por entre as árvores, saltou o terrível lobisomen. Maior que um homem, mais feroz que um lobo, a criatura tinha sangue em suas garras e presas. Havia feito alguma vítima recente.
Gritei por meu pai, mas foi em vão. O animal saltou e quase alcançou meu pé. Encolhi-me o máximo possível junto à árvore, enquanto o monstro, insistentemente, saltava e tentava nos pegar. O momento de maior desespero foi quando, em sua melhor tentativa, o lobisomen mordeu o xale de minha irmã. Puxei de volta, mas a peça rasgou e, por pouco, minha irmã - em prantos histéricos - não caiu junto.
A fera desistiu e foi embora, desmaiei sobre o galho e só despertei com os primeiros raios de sol e a voz do meu pai me pedindo para descer da árvore. Fiquei aliviado por ter salvo minha pequena caçula e mais ainda por ver que ninguém havia se ferido. Detalhei o horror da noite anterior e meu pai me consolou:
- Você foi um herói, filho.
Concordei e papai deu aquele seu velho sorriso brilhante. Desta vez, cheio de fiapos brancos do perfumado xale da minha irmã. Desmaiei e...
...e nada. Não aconteceu nada disso.
Não adianta. Não consigo dizer exatamente como foi.
Só tenho certeza de uma coisa: foi numa sexta-feira treze à meia-noite.
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